Londres – Uma exposição na Galeria Saatchi, em Londres, está mostrando a visão de dois estrangeiros sobre as questões ambientais e socioeconômicas que afetam a Amazônia.  Mas não é uma visão romantizada nem deslocada da realidade. O fotógrafo italiano Tommaso Protti e o jornalista britânico Sam Cowie vivem e trabalham no Brasil. 

Levando na bagagem o olhar de estrangeiros o conhecimento da realidade nacional, eles percorreram quatro estados – Maranhão, Pará, Rondônia e Amazonas – para documentar o que classificam de  crise social e humanitária que afeta a região assolada pelo desmatamento e pela violência. O trabalho venceu o Prêmio Carmignac de Fotojornalismo, concedido pela fundação francesa de mesmo nome, e está sendo exibido em um dos principais espaços culturais da cidade. 

Protti disse que o objetivo principal foi ilustrar as transformações sociais, expondo a verdade por trás do derramamento de sangue e da destruição que aconteceml  na região.

“Essas diversas formas de violência são consequência das mudanças no mercado global, assim como do crescimento exponencial do consumo mundial, da cocaína ao gado. 

Cientistas afirmam que a floresta está chegando a um ponto onde não haverá mais retorno por causa do desmatamento, em meio à exploração ilegal de madeira, apropriação de terras, e interesses dos Estados e dos setores privados que levaram a diversos projetos de extração de recursos. Eu acredito que é muito importante mostrar a realidade e questioná-la”. 

Cowie, que acompanhou o fotógrafo no trabalho, destacou que, além de denunciar os problemas e conflitos socioambientais, as fotos mostram também a vida das pessoas que moram na região. 

“Nós embarcamos em uma jornada até o centro da crise. Conhecemos ativistas indígenas que lutam para proteger a floresta para as gerações futuras, testemunhamos o desmatamento causado pela exploração de madeira, vimos os mineradores que exploram as riquezas da região para benefício próprio, as gangues que controlam o tráfico de cocaína, os venezuelanos desesperados que fugiram do conflito civil para se acomodar em acampamentos improvisados. 

A mostra fica em cartaz até 18 de julho. Confira alguns dos trabalhos expostos. 


Araribóia, Maranhão. 
Um membro da guarda florestal de Guajajara em um momento de triste silêncio ao ver uma árvore supostamente derrubada por madeireiros ilegais
Tommaso Protti para a Fundação Carmignac
Floresta Nacional do Jamanxim, Pará

Um incêndio dentro da Floresta Nacional do Jamaxim, no estado do Pará, uma área de proteção ambiental de mais de 1.3 milhões de hectares, e que também é uma das mais desmatadas do Brasil. A Amazônia teve em 2020 o pior início de uma época de queimadas na década, com cerca de 10.136 incêndios detectados nos primeiros 10 dias de agosto, um aumento de 17% em relação a 2019. As queimadas em áreas de proteção ambiental cresceram 81% comparado ao mesmo período em 2019. A maioria dos incêndios tem origem na agricultura: pequenos proprietários que queimam restos após a colheita, ou fazendeiros limpando terras cultivadas. Grileiros ilegais também destroem árvores para aumentar o valor da propriedade.

 

Tommaso Protti para a Fundação
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Crepurizão, Pará

Garimpeiros bêbados em um bar em Crepurizão, cidade voltada à mineração de ouro no sudoeste do Pará. A cidade serve como uma base para os mineradores pegarem pequenos aviões rumo a locais de mineração ilegal na região, incluindo terras indígenas e áreas de proteção ambiental. A economia de toda a cidade gira em torno da extração ilegal de ouro. 

Grajaú, Maranhão

Uma área desmatada no sul do Maranhão vista de um helicóptero do IBAMA. O Maranhão é uma das regiões mais afetadas por incêndios florestais e exploração ilegal de madeira. Cientistas dizem que a situação está chegando a um ponto decisivo: se o desmatamento continuar, a floresta pode nunca mais se recuperar. 

Tommaso Protti para a Fundação Carmignac

Território indígena de Kayapó, Pará

Crianças Kayapó brincam atrás de uma cascata no vilarejo Kuben-Kran Ken, no sul do Pará. O território Kayapó é a maior área tropical protegida do mundo, com mais de 3.2 milhões de hectares de floresta e cerrado , abrigand muitas espécies ameaçadas de extinção. Serve como uma barreira crucial para o desmatamento que avança pelo norte. 

Tommaso Protti para a Fundação Carmignac

Manaus, Amazonas

Um jovem sem vida na rua de um bairro  pobre, enquanto membros da família, vizinhos e a polícia aguardam para que as autoridades recolham o corpo e o levem para o necrotério. A vítima levou um tiro na cabeça, do lado de fora de sua casa. A polícia e residentes do local suspeitam que o assassinato  tenha ocorrido devido a uma dívida não paga relacionada a drogas. Manaus se tornou uma das cidades mais violentas do Brasil. Segundo autoridades locais, a maioria dos homicídios se relaciona com o tráfico de drogas. 

Tommaso Protti para a Fundação Carmignac

Altamira, Pará

Essas três árvores morreram durante a instalação da barragem hidrelétrica de Belo Monte, em Altamira no Pará, que inundou 400 km² de floresta. Na época de sua construção, a barragem foi condenada por ambientalistas e organizações da sociedade civil. Atualmente, o projeto permanece envolto em polêmicas, com sérias dúvidas quanto à sua viabilidade e denúncias de corrupção durante o processo licitatório.

Tommaso Protti para a Fundação Carmignac

Manaus, Amazonas

Um sem-teto bêbado anda com água e lixo até a cintura na zona portuária de Manaus. Fundada por padres jesuítas às margens do Rio Negro, um afluente do Rio Amazonas, Manaus passou de uma selva quieta para uma grande metrópole com 2 milhões de pessoas no meio da floresta. Hoje, é a mais rica e mais populosa cidade da Amazônia brasileira. Mas é também uma das cidades brasileiras com os piores indicadores socioeconômicos. 

Tommaso Protti para a Fundação Carmignac

Araribóia, Maranhão

Membros da guarda-florestal de Guajajara patrulhando a reserva indígena de Araribóia, no Maranhão, batem em um indígena que suspeitam ser colaborador de exploradores ilegais de madeira. 

Tommaso Protti para a Fundação Carmignac

Jenipapo das Vieiras, Maranhão 

Paulo Paulino, 25 anos, conhecido como Lobo Mau, foi morto em 1º de novembro de 2019 em uma emboscada feita por madeireiros ilegais dentro da terra indígena Araribóia. Ela foi membro da guarda-florestal Guajajara, no estado do Maranhão. Em várias cidades vizinhas, a economia local é baseada em grande parte na madeira ilegal e nas serrarias irregulares que oferecem empregos para os trabalhadores obres e não qualificados. Ativistas que enfrentam esses grupos sofrem perseguições, ameaças e até assassinatos.

Tommaso Protti para a Fundação Carmignac

Pau d’Arco, Pará

Um camponês sem-terra ergue uma placa marcando a ocupação da fazenda Santa Lúcia ,em Pau d’Arco. Em maio de 2017, a fazenda foi palco de um massacre sangrento,  com dez ativistas mortos pela polícia. A propriedade passou a ser ocupada por famílias da Liga dos Camponeses.

Tommaso Protti para Fundação Carmignac

 

As fotos foram publicadas com autorização da Galeria Saatchi e não podem ser reproduzidas. 

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